Entre os inevitáveis destroços do desabamento prematuro e a
esperança de uma reconstrução futura em bases outras -porém de sentimentos os
mesmos, com formas diferentes, modelos distintos e amor igual -vou por aqui
sacudindo a poeira, escorrendo os lamacentos vestígios que chegaram à alma que
ficou muito feia.
Nem sei se darei a mim mesmo a chance de recriar,acho que
perdi o trem,o minuto agora já é inevitavelmente o anterior e as horas são
outras e de um dia que foi ontem.
Como pensar no amanhã se tudo é pretérito e os deuses
conspiram de cara amarrada, bufando vingança e exigindo reparação?
Batem as portas dos meus erros mais inconfessáveis e pedem
indenizações muito altas e que eu não as poderia cobrir com este meu esgarçado
e sôfrego orçamento afetivo que restou.
Céu negro, de nuvens acomodadas em linhas de instabilidades
iminentes vai desabar e nem guarda–chuvas providenciei e o que é pior, será
intensa e sob forma de um temido temporal raivoso, exigindo um teto e de
concreto armado para me proteger.
Vasculho em volta, não tem nenhum, nem concreto e muito
menos um teto!
Estou em meio ao descampado das minhas ruínas, sem nada no
qual eu possa abrir uma porta ou fechar em segurança, muito menos ter um abrigo
para proteção.
Olho para o alto e ouço uma voz,são os ecos da minha
consciência e muitos pássaros voando,eles correm, fogem também,da tempestade
que vai chegar, serão correntes de ar desastrosas quentes e devastadoras
levando tudo de roldão,estapafúrdia antevisão dos Quintos dos infernos que
Dante Alighieri já havia descrito, em poemas, nesta vida insensata da nossa
Divina Comédia!
Treme o chão, e até Smetana pai musical do Rio Moldava,
espanta-se pois são águas que avolumam-se por terra com uma fúria que jamais
sua imaginação naquele rio criado e imortalizado em peça clássica, poderia
imaginar.
Em posição humilde de genuflexão, dobro joelhos e encosto o
rosto no solo frio,árido,e de repente tenho a impressão que havia achado a
beleza de um rosto perdido a encontrar o meu.
Não era, é sim um Lírio do campo, presente do único Deus,esse
menos raivoso,furioso,irritado vingativo e não clamava por retaliações
inevitáveis e acolhia assim minhas ultimas forças,derradeira vontade de unir
amor e paz,flor e canção,perdão e aceitação.
Um canto Gregoriano invade meus ouvidos, são todos em tons
de sopranos e suas variações mais próximas, todos com lindas modulações de um
cantar angelical, acima da terra,do bem e do mal,do certo e do errado,apenas
que eleva, chora contrito , pesaroso e envolve,estende a mão e no palco daquela
grande performance,desancoro e desaferro daquele porto de triste solidão.
-“Existe um mundo menos cruel, exigente, inflexível e
desumano ,sim” -retruco para a acidez das cobranças férreas de mãos implacáveis
e seus tacapes impiedosos que decapitam cabeças.
Então, o céu volta a ter um azul condescendente e acolhedor.
Nuvens agora, são imensos blocos de algodão suspensos e
leves.
Estou próximo a um altar ou seria uma mesa consagrada aos
sacrifícios religiosos?
É uma gruta,escura com muitas chamas de velas, nas pouca
iluminação.
Forço a visão, concentro o olfato que encontra o odor de
cera e desperta , agora sim,uma maravilhosa visão de um santo.
Que santo?
Espera... É com certeza , São Judas Tadeu!
Abraça-me com ternura e atrás dele em uma parede, um número
mágico e iluminado:301.
Estou em casa!
Comovente sua crônica, quando a comparamos com a vida humana, século XXI. Inteligentes metáforas que se concretizam, à medida que interagimos seu texto, com a nossa vivência.
ResponderExcluirAbraço.
CÉLIA RANGEL,
Excluircomovê-la é minha força maior para continuar tentando que isto se repita em você!
Obrigado!
Um abração carioca.
UAU! Adorei a reflexão que propusestes em suas metáforas, e seu estilo de escrita. Ganhou uma seguidora.
ResponderExcluirMARI B.
Excluire como gostei de saber disto!!!
Estive no seu blog , seguindo-a também.
Um abração carioca.