Meu repertório existencial é finito.

 


Sou um velho. Não um decrépito. Esse invólucro corporal que me trouxe até aqui apesar de muitos sois sobre a pele e excessivos prazeres da carne e do coração experimentados durante a vida não marcaram meu corpo de doenças incuráveis ou degenerativas. Até agora. Nunca tomei uma anestesia geral nos brancos ambientes hospitalares para que fuçassem e revirassem minhas tripas. Sou virgem no signo e intervenções cirúrgicas invasivas. Todos os meus pouquíssimos exames clínicos feitos desde o fio de cabelo às unhas dos pés generosamente sempre adjetivam os  resultados e sem alardes como compatíveis com a idade. Isso no entanto, não se faz da mesma forma caso existissem as tomografias para identificar minhas revoltas e indignações contra as injustiças sociais. Se o físico continua hígido toda minha vitalidade mental e sócio cultural , no entanto vive impregnado de canceres e suas malditas metáteses o que me torna um interlocutor pouco afável para os canalhas. Nunca fui o melhor. Jamais pretendi subir no pódio como um casto de comportamento inatacável e condutas indiscutíveis, porém, procuro guardar certa distância do ambiente indesejável onde chafurdam os porcos megalômanos adoradores de riquezas que se fizeram graças ao puro assassinato de um semelhante no nascedouro asfixiado na merda existencial e infecciosa dos quais foram roubados a chance de viverem. Nada contra as riquezas acumuladas fruto do trabalho., mas em geral não é o que se vê. E se meu corpo, essa casca que levarei para o crematório após a morte ainda dá sinais de resistência o que vejo no meu entorno é patético. Então invejo os macacos. Uma sociedade de alguns transgressores morais que criam bandeiras de lutas fantasiosas para justificarem a podridão em que se enroscaram. Detesto falsidade. Por ter um repertório existencial finito sempre entremeados de repulsas contra essa pequena mas atuante parte da sociedade que resolveu vestir a camisa da corrupção dos hábitos e costumes  e que criam frases feitas e slogans idiotas que nem eles mesmo acreditam, confesso que me tornei para os canalhas em geral e alguns em particular o alter. ego indesejável no sentido estrito que o filósofo Cicero formatou. Detesto servir de exemplo. No entanto, sempre peço aos contrários a mim que reconheçam entre nós aquela máxima definitiva que os amantes da Escola de Samba do Salgueiro sempre definimos: Não somos melhores nem piores, apenas diferentes! Querem queimar seus baseados, cheirar o pó maldito, financiando assim o crime desumano e organizado, fingir que o mundo aceita tudo que nós somos apenas porque nós somos, alardearem suas ideologias nazifascistas, jogarem bombas nos alicerces da democracia, elegerem o saque aos cofres públicos e riquezas deles advindas como normal , afinal todo mundo faz quando pode, entupirem-se de mansões , iates, quinquilharias e bugigangas materiais e ficar por aí pavoneando de terem ido a Disneylândia inúmeras vezes e atualmente morarem em Nova York às custas das roubalheiras familiares? Não contem comigo. Sou do subúrbio de Ramos, trabalhador desde sempre, já bati cartão de ponto e nunca fui vagabundo. Acordei muito de madrugada, trabalhei com favelados, voltei-me para as ciências sociais e tive sonhos de mudar o mundo, formatar uma nova crença entre meus pares que as sociais democracias são as mais justas. Ninguém vai mudar o meu caráter. Quem tiver morrendo afogado ou entrevado na cama de um hospital apesar de toda os  seus bens matérias e esperando angustiadamente pelo fim do seu sofrimento não culpe a Deus! A leviandade é arma dos covardes. Assuma até o ultimo suspiro que nada é por acaso e que o Deus que a maioria dos donos do mundo cospem-lhe na cara, não joga dados. Albert Einstein descobriu isso desde sempre e quem seria eu para contrariá-lo? Que chato! Viram como o meu repertório é finito? Ninguém tem mais tempo para ouvir-me com tantas reclamações e rabugices. Desculpem, falta de criatividade é quase a morte.

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